16 de novembro de 2012

A TPM dos portugueses e a Isabel Jonet

Esta semana todos fomos bombardeados pelas notícias das ofensivas declarações da Presidente do Banco Alimentar Contra a Fome. Vi as notícias no telejornal e vi alguns comentários no facebook, mas não tinha ainda ouvido a tão polémica entrevista e tinha um certo receio de o fazer e ficar deveras irritada.
Ontem, finalmente, vi a entrevista. Ontem ouvi atentamente as declarações de Isabel Jonet e procurei em cada frase um motivo para me indignar. Acontece que não encontrei nem um, mas fiquei na mesma verdadeiramente irritada, só que pelo facto dos portugueses continuarem a tapar o sol com a peneira em vez de encararem a realidade!
Acho que grande parte da indignação de algumas pessoas surge da incapacidade de compreender de que portugueses estava Isabel Jonet a falar e de um deturpador de afirmações que alguns colocam nos ouvidos sempre que se lhes é dirigida alguma crítica. 
Meus caros, Isabel Jonet não estava a falar das pessoas mais pobres. Ela não estava a falar das pessoas que realmente não têm o que comer, às quais o dinheiro não chega, às que passam momentos dolorosos. Não sei se repararam, mas ela trabalha numa instituição que se dedica a ajudar essas mesmas pessoas... Isabel Jonet estava a alertar os que têm hipótese de fazer opções na forma como gerem o seu orçamento familiar, os que têm a chance de escolher como gastam o seu dinheiro, que é cada vez menos, por sinal - a classe média.
"Estamos a empobrecer porque vivíamos acima das nossas possibilidades": não é isto mais do que óbvio, mais do que discutido e admitido? Tanto o Governo português como grande parte das famílias portuguesas viviam acima das suas possibilidades, sem qualquer planeamento, sem pensar no dia seguinte.
"Ou vamos a um concerto de Rock ou vamos tirar uma radiografia quando caímos numa aula de ginástica": quantos, a sério, digam quantas pessoas é que vocês conhecem que têm dinheiro para ir a concertos ou a saídas à noite, mas depois não conseguem gastar dinheiro num tratamento médico com o mesmo valor? Não estarão as prioridades trocadas? Não estarão as eventualidades desprevenidas?
"Se nós não temos dinheiro para comer bifes todos os dias, não podemos comer bifes todos os dias": exactamente! Algumas pessoas têm pânico quando se fala em poupar na alimentação, mas isso é uma certa limitação de perceber o verdadeiro conceito. Poupar na alimentação não significa comer mal, não significa abdicar de nutrientes ou prejudicar a saúde, na maioria dos casos significa até o oposto. Repensar a alimentação e as opções que tomamos no supermercado não me parece uma sugestão nada ofensiva.

O facto de termos de fazer este tipo de coisas, o facto de estarmos nesta situação é revoltante? É, muito. Mas não se revoltem com quem nos aconselha sobre o que fazer nesta nova realidade, revoltem-se com quem nos pôs nesta situação.
Digo, do alto da minha irritação, que os portugueses foram extremamente injustos e ofensivos com a Presidente do Banco Alimentar Contra a Fome. As reacções àquelas declarações mais pareciam uma crise de TPM colectiva. O facto de ela ter razão chateia, mas não matem o mensageiro. E o facto de ela ter toda a moral, conhecimento de causa e grande obra feita para falar, também deve ser uma grande chatice para muitos.